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Sobre nudes, estabilidade mental e Kylie Jenner


Faz exatamente um ano que eu recebi um diagnóstico de alopécia areata e comecei a me entupir de cortisona pra controlar a queda de cabelo, entrei na análise porque doença autoimune a gente trata com remédio e olhando pra dentro, e saí desmarcando todos os jobs e compromissos da minha agenda pra poder dar conta do que estava acontecendo. Minha analista disse que eu precisava pendurar as coisas como quem pendura uma conta – suspender pra cuidar.

Agora há pouco, antes de desligar um telefonema com a minha mãe, formulei a seguinte frase: “To aqui soterrada de trabalho mas to calma, tudo tranquilo.” Depois entrei num banho pra completar o meu break vespertino. Estou uns quatro ou cinco quilos mais gorda do que estava um ano atrás. Não sei exatamente porque não subo mais em balança, mas sei de olhar. Ontem mesmo estava catando uns nudes antigos, pensando se mandava ou não pra um rapaz aí, e fiquei me admirando nas fotos que encontrei: caralho, olha essa barriga! Bons tempos de Ballet Fitness.

Na real, eram péssimos os tempos. Meu corpo tava me expurgando – cabelo caindo, dermatite pra todo lado, falta de ar dia sim e outro também. Mas eu tava magrinha, belos nudes! É horrível como a gente tende a registrar só isso. Não importa que hoje eu tenha uma agenda organizada, que eu acorde de manhã tranquila, que eu esteja uns 60% mais certa do que estou fazendo e do que eu pretendo nesta vida – um ano atrás eu não tinha essa celulite e essa calça que eu quero usar hoje caía um pouco melhor.

Mas é uma batalha que a gente trava diariamente mesmo, e aí entra a cultura pop pra dar uma ajudinha. Recentemente, sempre que estou me arrumando e chego à conclusão de que já estive mais magra, pisca no fundo da minha cabeça uma selfie da Kylie Jenner. A própria – rebenta mais jovem do clã Kardashian, rainha dos batons, do bocão e do bundão. Olho pra mim, penso na Kylie toda voluptuosa e empurro pra escanteio as minhas musas esquálidas noventistas. To the left, to the left, Kate Moss. Não é fácil, mas como é bom ter referência, né? Como é bom não ser obrigada.

Por isso me irrita tanto a falta de cuidado que muita gente tem ao criticar e destituir de importância essa cultura pop massiva. Não é engraçado que você não saiba quem são Kylie Jenner e Wesley Safadão. Eles estão aí influenciando o seu ideal de beleza e você talvez nem saiba. E, nesse caso, se é pra ser gado, melhor ser com um pouquinho mais de consciência, né nom? E ok que cultura pop é pharmacon, que ajuda desajudando, mas estou contando a minha experiência. Claro que sei que tem muita menina se torturando pra ser igual a ela. Mas não é interessante pensar que agora seja ela e não a Keira Knightly? Apenas prisões diferentes? Sei não.

Sei que tenho me visto de calças mais justas e decotes mais abertos e tenho achado sexy em vez de tosco, e isso é metade maturidade e metade reflexo de alguma coisa que eu não controlo. No mais, que bom viver num tempo em que estamos tentando inserir mais corpos na mídia e no showbizZzZzZ. Até eu que sou branca, cishétero e tenho grana preciso de novas referências. Um beijo pros meus idealizados anos 90, mas aqui em 2016 estou bem melhor representada e umas mil vezes mais empoderada.

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